Sempre achei que seria mãe – de três, e das boas! Era uma convicção muito sincera que, com o tempo, passei a encarar como fantasia. Virou sonho com o namorado na faculdade, cultivado com cuidado (contraceptivo, inclusive), à espera do momento certo. Depois de sete anos, acordei sozinha...
Quatro anos e dois namoros depois, comecei a namorar o Zé, com quem finalmente superei meu chamado “namoro de referência”. Eu precisava me sentir mais envolvida e mais amada do que os namoros anteriores para acreditar que o relacionamento valesse a pena. Não vou me alongar com nossa história – que é linda e merece ser registrada, mas aqui, quero falar sobre ser mãe.
Eu tinha me perdido dessa idéia por um tempo. Meus planos se voltaram para o lado profissional, perseguindo estabilidade e autonomia financeira – pré-requisitos para pensar em construir família. Durante os anos de bolsista profissional, a instabilidade e baixo valor da bolsa foram justificativas razoáveis para adiar a maternidade. Dificuldades de voltar a viver com meus pais, após seis anos de vida em república, me motivavam a sair, mas não havia a menor condição de montar um “apertamento” para mim. Além disso, eu sabia que se saísse para morar sozinha, teria muito mais dificuldade de dividir minha vida com alguém. Sou territorialista e estava bem cética quanto à perspectiva de um novo relacionamento.
Meu namoro com o Zé começou quando fui contemplada com a bolsa de doutorado. Um ano depois, o convívio com minha mãe se tornou difícil e comecei a procurar quarto para alugar. Foi quando o Zé propôs que procurássemos um lugar para morarmos juntos. E assim fomos.
A vida de casal tem sido tão boa e feliz, acabei o doutorado e, no ano seguinte, abriu processo seletivo para professor na EACH. Prestei, passei e, em 2007 comecei oficialmente a vida profissional. E pude testemunhar: isso levou a um baby boom na escola! A produtividade de bebês era altíssima, vários colegas tendo o tão sonhado filho.
Nisso, várias amigas anunciavam seus rebentos ou algumas já os tinham bem grandinhos. Outras, convictas e tentando. E eu?...sinceramente, não sentia soar alarme de relógio biológico, nem necessidade de ser mãe.
Conversar com o Zé só piorava: ele não queria ser pai. Achava que tinha passado da época, dizia que gostava da nossa vida como estava. Era verdade – eu também pensava que teria tido antes; também gostava de nossa vida como estava. A idéia de ser mãe passou a me assustar: todo dia, o dia todo, a vida toda? Revisava o quanto foi sacrificante para minha mãe, constatava a impossibilidade de eu ser mãe nos moldes que ela foi (integralmente dedicada aos filhos), testemunhava casamentos que se acabavam com filhos ainda pequenos...
A idéia de mudanças na estrutura da nossa vida também me assustava. Seria possível ser melhor do que era?
A única certeza que os aventurados nos davam era: filhos mudam a vida. Ninguém dizia: filhos melhoram a vida. Alguns tentavam explicar (fico imaginando que cara eu fazia para receber explicações sem solicitá-las): dá muito trabalho, mas traz recompensas.
Outras dúvidas surgiram: não tenho vontade agora, mas e se depois eu quiser e não puder mais? O que leva as pessoas a terem filhos? – para essa pergunta, ouvi respostas nada convincentes: para não ficar só ou ter quem cuide de você na velhice; porque casais têm filhos; porque chega uma hora que falta algo na vida do casal; para fazer companhia...
Sempre fui intensa em meus sentimentos e sensações, mas logo em seguida, eu os processo num filtro racional: meço e peso, pondero, situo e projeto na minha vida (não se trata de necessidade, mas um mecanismo automático para mim). Estava difícil resgatar aquela convicção espontânea e original de que seria mãe (e das boas!). O filtro de anos precisava ser limpo.
Passei a me policiar: será que nego alguma vontade por saber que o Zé não quer? Essa conversa eu tive abertamente com ele e combinamos que se eu tivesse vontade, conversaríamos novamente sobre isso.
Passei a notar: ele brinca com crianças de um jeito... certamente seria um bom pai.
Decidi e comuniquei: vou parar de tomar pílula. Preciso sentir meus hormônios.
Foi o nível máximo de decisão em direção a uma gravidez. Na comemoração do aniversário do Zé, recapitulo a cena, embora não me lembre exatamente o dia, e lembro de ter me perguntado se deveríamos ter usado camisinha. Como havia menstruado na semana anterior, estimei que o período fértil estava por vir e pensei despreocupadamente, “se engravidar, terá sido com muito amor e prazer”.
Início de abril, TPM – peito dolorido, intestino preguiçoso. Começou a descer (“ah, não foi desta vez”, com um sentimento que não era alívio nem frustração). E depois, parou! E agora, Zé? “Agora, vamos fazer o teste e confirmar” – com uma tranqüilidade que me deixou insegura. Confirmamos e ele continuou tranqüilo. Eu fiquei sem chão e sem luz por 24h – não conseguia processar qualquer sentimento ou sensação. Depois, fato consumado, calendário consultado, Zé ao meu lado, me rendi às sensações e sentimentos: estou mãe; o que pensava sobre ser mãe era fantasia. Estar mãe tornou as preocupações das 24 horas iniciais pequenas e inofensivas – trabalho, problemas, planos de comprar casa, projetos de pesquisa – tudo ficou em outro plano. Fui inundada por uma paz indescritível que tem me mantido muito tranqüila à espera de continuar com o capítulo “ser mãe” – com o Fernando Akira nos braços.
Helene
Lindo, amiga. Emocionante, como sempre. Feliz é o Fernando Akira, pelos pais amorosos e dedicados que já tem. (pensamentos "tudibom" da "tia" aqui)
ResponderExcluirNossa! Fiquei até arrepiada!!! Muito lindo! Tenho certeza de que você será uma ótima mamãe!!!Um dia quero ter essa sensação!!
ResponderExcluir